O suor escorria-lhe pela pele bronzeada do pescoço e dos braços musculados. Parou o seu trabalho para limpar as gotas de suor salgado que já lhe ardiam nos olhos. Estendeu a mão para o odre com água fresca que se encontrava pendurado numa estaca de madeira e levou-o á boca sorvendo avidamente o liquido que lhe refrescou a garganta seca.
A aldeia permanecia tranquila. Uma tranquilidade doentia. A qualquer momento seriam atacados, que os deuses fossem misericordiosos, mas ele sabia que não teriam qualquer hipótese.
Desviou os olhos para as imensas estepes que se estendiam até perder de vista...e retomou o seu trabalho. Não tinham hipóteses mas não desistiriam sem lutar. O barulho do martelo que trabalhava o aço incandescente de uma espada espalhou-se pelo ar do entardecer, ecoando pela planicie e pela ligeira floresta que rodeava o rio. Siurd era o filho mais velho do chefe da aldeia. Situados no extremo Leste da Média, seriam os primeiros a receber as hostes dos Alanos que já marchavam para atravessar o reino...todas as aldeias tinham sido avisadas pelos emissários do Rei Pacorus. Há cerca de 1 ano que os Alanos haviam firmado um tratado com o Rei de Hyrcania que permitiria aos primeiros atravessarem a passagem sem qualquer impedimento.
Siurd manteve o ritmo forjando espada atrás de espada. Queria acabar mais cedo o seu trabalho...os vigias já tinham avistado a caravana nómade Sarmata que trazia as especiarias, lãs e pequenas porções de metal em bruto encomendados no Verão anterior.
A caravana Sarmata traria mais que isso...remédios, musica e alguma dança para animar os espíritos consumidos pelo medo da guerra iminente. E notícias...um dos bens mais preciosos e escassos. Os Sarmatas há muito que viviam deambulando pela imensidão das Estepes, sempre a cavalo ou em caravanas como esta. A sua origem era estranha, sendo os filhos de um grupo de guerreiros Citas que se juntara a um bando de Amazonas. Viviam para além do Rio Don, numa área de floresta que delimitava as estepes. Mas passavam lá pouco tempo. Eram como o vento. Homens e mulheres eram conhecidos pela sua valentia e bravura e pelas artes que praticavam, que incluíam o conhecimento das ervas, da musica, da adivinhação e da dança. Não dominavam a arte de trabalhar o metal, pelo que sempre que podiam trocavam o seu saber e tesouros exóticos conseguidos em outras regiões por armas que lhes permitissem manter a sua segurança. Eram extremamente engenhosos com ossos...Siurd nunca tinha visto peitorais como aqueles, feitos de ossos que eles trabalhavam e decoravam com motivos secretos e de uma forma que mais ninguém conhecia.
Eram também exímios negociantes. As mulheres tinham a mesma liberdade que os homens e muitas caravanas havia que eram lideradas por elas.
Siurd arrumou as ferramentas e utensílios da sua oficina, perguntando-se ela viria também. Era apenas uma criança na estação anterior, esguia, de pele dourada escura, olhos rasgados que pareciam carvão por vezes em brasa e cabelos revoltos sempre em desalinho...era uma estranha criatura, mas tinha-lhe captado a atenção e ele esperava poder voltar a vê-la. Talvez fosse pela diferença...na aldeia eram todos louros e altos, tal como os Alanos. Na verdade a origem de quase todos os povos das estepes estava interligada em algum ponto da historia. A pequena Eridanis era a filha mais nova de Samat e Yancai, um dos clãs mais poderosos dos Sarmatas. Devia ter aproximadamente 15 anos agora...ele era já bastante mais velho. Tinha então 21 anos vividos.
Como filho mais velho seria ele a assumir a liderança após a morte de seu Pai...isto se a aldeia ainda existisse. Ele esperava que sim. Ambicionava há muito unificar as aldeias de Leste de forma a construírem boas defesas contra novas invasões. Siurd havia servido no exército do Rei e tinha-se destacado por ser um excelente guerreiro e tinha sido lá que tinha também aprendido a sua arte com o ferro e com o aço. Regressara há pouco mais de um ano para junto do pai que se encontrava doente e que o mandara chamar para lhe passar a chefia, mas também com uma missão incumbida pelo próprio Rei.
Samat vinha também ao seu encontro e trazia as informações que o Rei Pacorus aguaradva. Estas informações vinham em código, e nem Samat sabia o seu significado. Siurd era dos únicos que podia traduzir tal missiva, complementá-la com as suas próprias observações e então codificá-la novamente para que um dos velozes cavaleiros nóades a levasse até ao Rei.
Siurd montou o seu cavalo e atravessou a aldeia em galope veloz, os cascos fortes levantando nuvens de pó á sua passagem. Chegado ás margens do Rio que corria a Norte da povoação, deixou-se escorregar do cavalo, despiu a túnica e os calções de pele de camelo e descalçou as botas que lhe chegavam ao joelho e apertavam com cordões de couro escuro. A água estava gelada e a pele arrepiou-se ao sentir o choque do contacto inesperado, mas sabia-lhe bem lavar o pó e o suor do trabalho que o absorvera todo o dia.
Mergulhou. Por momentos deixou-se pairar submerso pelas águas cristalinas, admirando o silêncio subaquático e a forma como a luz atravessava a água e lhe emprestava reflexos de várias cores.
Ao vir ao de cima sacudiu a cabeça lançando o cabelo comprido para trás das costas e abriu os olhos ...
Caso não tivesse mergulhado teria notado que os pássaros tinham calado os seus cantos e que a própria atmosfera parecia ter-se modificado, ficando quase suspensa...com uma ligeira tensão pairando no ar. Na margem á sua frente erguia-se uma sombra, imóvel, alguém a cavalo, recortada em contra-luz com o Sol poente.
A aldeia permanecia tranquila. Uma tranquilidade doentia. A qualquer momento seriam atacados, que os deuses fossem misericordiosos, mas ele sabia que não teriam qualquer hipótese.
Desviou os olhos para as imensas estepes que se estendiam até perder de vista...e retomou o seu trabalho. Não tinham hipóteses mas não desistiriam sem lutar. O barulho do martelo que trabalhava o aço incandescente de uma espada espalhou-se pelo ar do entardecer, ecoando pela planicie e pela ligeira floresta que rodeava o rio. Siurd era o filho mais velho do chefe da aldeia. Situados no extremo Leste da Média, seriam os primeiros a receber as hostes dos Alanos que já marchavam para atravessar o reino...todas as aldeias tinham sido avisadas pelos emissários do Rei Pacorus. Há cerca de 1 ano que os Alanos haviam firmado um tratado com o Rei de Hyrcania que permitiria aos primeiros atravessarem a passagem sem qualquer impedimento.
Siurd manteve o ritmo forjando espada atrás de espada. Queria acabar mais cedo o seu trabalho...os vigias já tinham avistado a caravana nómade Sarmata que trazia as especiarias, lãs e pequenas porções de metal em bruto encomendados no Verão anterior.
A caravana Sarmata traria mais que isso...remédios, musica e alguma dança para animar os espíritos consumidos pelo medo da guerra iminente. E notícias...um dos bens mais preciosos e escassos. Os Sarmatas há muito que viviam deambulando pela imensidão das Estepes, sempre a cavalo ou em caravanas como esta. A sua origem era estranha, sendo os filhos de um grupo de guerreiros Citas que se juntara a um bando de Amazonas. Viviam para além do Rio Don, numa área de floresta que delimitava as estepes. Mas passavam lá pouco tempo. Eram como o vento. Homens e mulheres eram conhecidos pela sua valentia e bravura e pelas artes que praticavam, que incluíam o conhecimento das ervas, da musica, da adivinhação e da dança. Não dominavam a arte de trabalhar o metal, pelo que sempre que podiam trocavam o seu saber e tesouros exóticos conseguidos em outras regiões por armas que lhes permitissem manter a sua segurança. Eram extremamente engenhosos com ossos...Siurd nunca tinha visto peitorais como aqueles, feitos de ossos que eles trabalhavam e decoravam com motivos secretos e de uma forma que mais ninguém conhecia.
Eram também exímios negociantes. As mulheres tinham a mesma liberdade que os homens e muitas caravanas havia que eram lideradas por elas.
Siurd arrumou as ferramentas e utensílios da sua oficina, perguntando-se ela viria também. Era apenas uma criança na estação anterior, esguia, de pele dourada escura, olhos rasgados que pareciam carvão por vezes em brasa e cabelos revoltos sempre em desalinho...era uma estranha criatura, mas tinha-lhe captado a atenção e ele esperava poder voltar a vê-la. Talvez fosse pela diferença...na aldeia eram todos louros e altos, tal como os Alanos. Na verdade a origem de quase todos os povos das estepes estava interligada em algum ponto da historia. A pequena Eridanis era a filha mais nova de Samat e Yancai, um dos clãs mais poderosos dos Sarmatas. Devia ter aproximadamente 15 anos agora...ele era já bastante mais velho. Tinha então 21 anos vividos.
Como filho mais velho seria ele a assumir a liderança após a morte de seu Pai...isto se a aldeia ainda existisse. Ele esperava que sim. Ambicionava há muito unificar as aldeias de Leste de forma a construírem boas defesas contra novas invasões. Siurd havia servido no exército do Rei e tinha-se destacado por ser um excelente guerreiro e tinha sido lá que tinha também aprendido a sua arte com o ferro e com o aço. Regressara há pouco mais de um ano para junto do pai que se encontrava doente e que o mandara chamar para lhe passar a chefia, mas também com uma missão incumbida pelo próprio Rei.
Samat vinha também ao seu encontro e trazia as informações que o Rei Pacorus aguaradva. Estas informações vinham em código, e nem Samat sabia o seu significado. Siurd era dos únicos que podia traduzir tal missiva, complementá-la com as suas próprias observações e então codificá-la novamente para que um dos velozes cavaleiros nóades a levasse até ao Rei.
Siurd montou o seu cavalo e atravessou a aldeia em galope veloz, os cascos fortes levantando nuvens de pó á sua passagem. Chegado ás margens do Rio que corria a Norte da povoação, deixou-se escorregar do cavalo, despiu a túnica e os calções de pele de camelo e descalçou as botas que lhe chegavam ao joelho e apertavam com cordões de couro escuro. A água estava gelada e a pele arrepiou-se ao sentir o choque do contacto inesperado, mas sabia-lhe bem lavar o pó e o suor do trabalho que o absorvera todo o dia.
Mergulhou. Por momentos deixou-se pairar submerso pelas águas cristalinas, admirando o silêncio subaquático e a forma como a luz atravessava a água e lhe emprestava reflexos de várias cores.
Ao vir ao de cima sacudiu a cabeça lançando o cabelo comprido para trás das costas e abriu os olhos ...
Caso não tivesse mergulhado teria notado que os pássaros tinham calado os seus cantos e que a própria atmosfera parecia ter-se modificado, ficando quase suspensa...com uma ligeira tensão pairando no ar. Na margem á sua frente erguia-se uma sombra, imóvel, alguém a cavalo, recortada em contra-luz com o Sol poente.
Piscou os olhos para clarear a visão e levou a mão instintivamente á cintura, onde ainda há momentos pendia a faca presa no cinto largo. Foi então que a figura falou...
"Procurais uma arma meu Senhor?"
A sua voz e o riso contido denunciaram que se tratava de uma mulher jovem, e Siurd sorriu quase adivinhando de quem se tratava...
"A que tendes não deve ser de muito uso caso a água esteja tão gélida como promete...Será que um homem desta tribo aceita partilhar a água do seu rio com uma nómada empoeirada?"
"Procurais uma arma meu Senhor?"
A sua voz e o riso contido denunciaram que se tratava de uma mulher jovem, e Siurd sorriu quase adivinhando de quem se tratava...
"A que tendes não deve ser de muito uso caso a água esteja tão gélida como promete...Será que um homem desta tribo aceita partilhar a água do seu rio com uma nómada empoeirada?"
(...to be continued...)
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"Sei que tenho de te deixar partir...
De onde vem este medo de te perder??"
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